"O QUE FAZEMOS POR NÓS PRÓPRIOS MORRE CONNOSCO, MAS O QUE FAZEMOS PELOS OUTROS E PELO MUNDO PERMANECE. E É IMORTAL." (ALBERT PINE)

Museu José Manuel Soares (Casa da Cultura - Pinhel, Guarda)

Museu José Manuel Soares (Casa da Cultura - Pinhel, Guarda)
A equipa de "ABYSSUS LUSITANIS - O Abismo de Portugal" apoia e procura auxiliar a divulgação e convidar os nossos leitores a visitar o Museu José Manuel Soares (Casa da Cultura), em Pinhel (Guarda).

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

A (DES)EDUCAÇÃO EM PORTUGAL - 2010


Dizia António de Oliveira Salazar, por sinal um "dr", que e cito: "um povo culto é um povo ingovernável"...

Tal como desde há muitos anos serviu de prova, todos os que governam Portugal desde Novembro de 1975 até à actualidade (e, infelizmente, prevejo que se venha a prolongar...) empenham-se pela manutenção de um povo inculto – e, portanto, fácil de ser governado à maneira deles. Os populistas neo-liberalistas PS, PSD e CDS-PP desempenham este papel com uma mestria assustadora. Já Medina Carreira afirmou, há tempos, que está-se a transformar Portugal numa fábrica de pequenos doutores – hoje, tudo é "dr"! Mas cabe colocar-se a questão: até que ponto além de "dr"s são realmente doutores? Por outras palavras: até que ponto Portugal não é um povo de doutores, mas que realmente são doutores e não apenas portadores de um título quais burros-de-carga que portam umas tralhas e palhas que lhes metem nas costas?

Há cerca de uma semana, ou pouco mais, foi notícia nacional o facto de as médias de Matemática se encontrarem num patamar escandaloso – um em cada dez alunos do 9º ano (o antigo 5º ano do liceu) teve nível 1 (numa escala de 1 a 5), ou seja... se fosse em nota escrita, provavelmente corresponderia ao "Muito Mau" ou ao "Não Satisfaz - (menos)", em valores seria inferior aos 6 valores. Fora outros resultados que não mereceram destaque nos media, mas que de qualquer forma são graves (Português, Físico-Químicas, Biologia e Geologia, entre outras). Cabe perguntar-se, obviamente, como se há-de combater este facto.

Admira a demora com que os actuais governantes vieram afirmá-lo, mas finalmente ouvimos a maior e mais esperada palhaçada de todas: o governo PS vem afirmar como urgente o fim dos chumbos nos liceus. Como era espectável, o maior populista actual – claro que me refiro ao PSD, que conquista eleitores através da afirmação de uns quantos disparates e baboseiras que soam bem aos menos informados e que contentam-se com uma simples oposição sem a proposta de medidas concretas e (talvez) eficazes – veio afirmar-se contra o PS, outro populista de renome. E porquê o fim dos chumbos? Segundo o PS, será porque nos países como a Suécia tal acontece, e porque os chumbos afectam psicologicamente os estudantes.

Se na Suécia tal acontece e há sucesso, é porque o povo tem uma formação diferente da que é imposta em Portugal – veja-se a atitude desses povos noutros contextos como a homossexualidade ou a religião: há liberdade total. Não há preconceitos. E há um enorme combate à ignorância, coisa que em Portugal deixou de existir desde Novembro de 1975, e que não existia antes da Revolução de Abril. Analise-se, primeiramente, o povo português – a fim de contextualizarmos esta teoria à sociedade que temos. Deparamo-nos com uma sociedade onde impera o facilitismo (ainda é recente a hilariante medida de os alunos do 8º ano (antigo 4º ano do liceu) poderem saltar para o 10º ano (antigo 6º ano do liceu) realizando apenas, para tal, um exame – medida que teve, para já, um insucesso enorme), onde impera o oportunismo e com um povo que não possui uma vontade muito forte de trabalhar: diga-se a verdade!

Além disso, os estudos têm de ser pagos – logo, com a onda de desemprego actual, pergunto-me onde serão pagas as propinas, por muito baixas que sejam, bem como os livros. E a onda de privatizações só vem piorar este facto.

Antes de passar a uma análise própria, devo salientar aos caros leitores que ainda sou um estudante (do ensino superior), e que aquilo que afirmo é apenas com a experiência de qualquer outro estudante. Ao invés de limitar-me a estudar e a prosseguir na vida, tenho por hábito analisar tudo o que me rodeia, daí que possa formular uma teoria que, mesmo que não se encontre correcta, já é um enorme contributo para que se encontrem soluções de facto para combater o flagelo da (des)educação em Portugal. Além disso, sou descendente de muitos professores e de um inspector de ensino, que também contribuíram (indirectamente) para a formulação de um ponto de vista próprio. A minha opinião sobre esta matéria, com as devidas actualizações e/ou adaptações (como é óbvio), já formulei há cerca de seis anos atrás (ou seja, então eu era estudante do 9º ano, antigo 5º ano do liceu) – e devo sublinhar que sofreu alterações e/ou actualizações irrisórias até hoje.

Uma correcta análise do estado da Educação em Portugal não pode basear-se, somente, numa passagem de olhos pelos números – é necessário "sujar-se as mãos" e não fazer-se como Pilatos, que pretendeu mantê-las como as mais limpas do mundo. Cada aluno tem o seu problema, e cada professor tem o seu problema. É urgente a análise de cada problema em concreto – por exemplo, os alunos que frequentam uma escola do centro da cidade não têm os mesmos problemas que os alunos de uma escola de um local como a afamada Cova da Moura. E mesmo dentro de uma única escola, o aluno X não é minimamente igual ao aluno Y, o que leva à inevitável conclusão de que só o aprofundamento dos casos em análise pode levar a uma reforma eficaz do ensino.

Bem sei que os exemplos de cada um não são para ser generalizados nem servem de exemplo para todos, mas peço aos caros leitores que me permitam dar o exemplo da minha mãe, actualmente aposentada, que foi professora do ensino primário. Ensinou em diversas escolas, começando a sua carreira nos finais dos anos sessenta. Além de professora, foi metodóloga (explico: um metodólogo era um professor que ensinava, em horário pós-laboral, adultos das mais diversas idades a ler e escrever... aliás, davam-lhes aulas da 1ª classe à 4ª classe), chegou a integrar o corpo de júris para avaliar recém-formados futuros professores para os avaliar no que diz respeito às suas competências para ensinar, directora de escolas (em Benfica) e pelo seu excelente curriculum vitae foi convidada a ser inspectora de ensino (convite que recusou). No último ano da sua carreira (trabalhava então numa escola em Lisboa), foi homenageada com o título de "Melhor Professora do Ano", cerimónia a que assisti (tinha cerca de 13 anos de idade) e que achei mais do que merecido. A dada altura da sua carreira, por volta de 1994 ou 1995, deu aulas numa escola do centro de Lisboa, cujos alunos (sem excepção visível) eram filhos de proxenetas e de prostitutas (passo as expressões). Alguns deles sofriam maus tratos por parte dos pais, outros encontravam-se psicologicamente perturbados devido às "profissões" dos seus pais, etc. Nessa turma, não havia aluno que não fosse tri-repetente ou mais (ou seja: no mínimo, já haviam chumbado três vezes seguidas). Com toda a sua dedicação, analisando cada caso individualmente, conseguiu por fim que essa turma passasse de ano – por motivos que recuso-me a expor, acabou por abandonar essa escola, tendo sido transferida para outra escola. Nessa outra escola, teve um aluno que sofria de um distúrbio que não consigo explicar... literalmente, os olhos nunca estavam parados, e se as letras não fossem quase do tamanho de uma folha A4 ele não conseguia ler nada. No entanto, apesar da devoção e dedicação que esse aluno tinha dos seus pais, nunca se havia compreendido o porquê de ele não conseguir acompanhar os outros colegas. Analisando individual e empenhadamente o aluno, recomendou aos seus pais que fosse a médicos, e estes deram o recado: para o aluno conseguir ler, as letras tinham de ser do tamanho que referi, fora outras coisas que dificultavam e muito a vida da minha mãe enquanto professora. Mas ela ajudou ao máximo: o problema do aluno não era psicológico (era tão normal como eu ou outro qualquer leitor deste sincero contributo), era apenas visual (e, quiçá, neurológico) – ele conseguia aprender tudo como os outros. A última vez que se soube desse aluno, encontrava-se a progredir bem nos estudos, com considerável sucesso (então era aluno do liceu). Fora outros tantos casos – no início de carreira, nas condições que referi, a minha mãe dava, também, explicações ao domicílio. Igualmente fez tal em escolas de Alenquer (isto já nos anos 80, princípio dos anos 90 – ensinou nessa escola, mais precisamente em Canados, durante muitos anos).

Além de querer homenagear a minha mãe, bem como todos os professores deste país, expondo este exemplo, apenas quis sublinhar o seguinte: é preciso analisar-se cada caso em concreto, e não basear-nos somente em números, superficialmente.

Outro ponto de vista: por vezes, o defeito é do próprio professor. É um facto! Nos tempos antigos, além da avaliação dos professores aquando do fim da sua formação (como mencionei, a minha mãe chegou a integrar júris de avaliação como aqueles que tentei descrever), havia também a inspecção das escolas (o meu avô paterno foi inspector de ensino antes e após a Revolução de Abril, e antes de ser inspector foi professor em Lisboa – faleceu em 1977, portanto nunca o conheci). Apesar de se considerar que os inspectores de ensino eram "bichos-papões", pergunto-me até que ponto não era eficaz a avaliação dos professores por esse meio. Do que ouço daqueles que conheceram o meu avô, sei que ele era o mais justo possível, e sei que a minha mãe nunca foi injustiçada por qualquer inspector. O meu pai foi professor de Físico-Químicas e de Matemática, e também nunca se queixou. A proposta – já antiga – do anterior governo de José Sócrates em criar um sistema de avaliação, segundo o qual os professores avaliavam-se uns aos outros, era puramente ridícula, e aplaudi a actual Ministra da Educação quando afirmou (vamos ver se é verdade!) que essa medida não iria vigorar. Essa medida era sinónima de virar os professores uns contra os outros, além da enorme possibilidade da existência de injustiças. Mas uma avaliação correcta dos professores, que não sei qual seria (a inspecção dos professores? a avaliação dos recém-formados futuros professores? outra medida de que ainda ninguém se lembrou?) mas de certeza absoluta que não é a proposta pelo governo PS, seria capaz de produzir bons resultados.

No caso concreto da Matemática, pergunto-me porque é que os professores desta área são formados em Matemática. O meu pai, que foi professor de Matemática, nunca se formou em Matemática na vida (apesar de ser formado numa área de Ciências). O melhor professor de Matemática que tive na vida era formado em Física, o melhor professor de Matemática que o meu pai teve na vida era engenheiro... enfim, pergunto-me até que ponto não seria mais eficaz colocar-se como professor de Matemática alguém qualificado para tal, mas formado numa área de paixão à Matemática e não em Matemática (ou seja: porque não um formado numa área das Matemáticas e não um formado em Matemática). É uma questão a analisar.

E como último ponto de vista, falemos do próprio programa. Como estudante (do ensino superior), devo gritar em plenos pulmões: os programas do liceu estão todos, sem excepção, mal feitos!

O programa de Matemática no 12º ano, por exemplo, é extremamente denso e complexo para ser dado num só ano, enquanto existem anos, também imprescindíveis, mas cujo programa é mais simples e possível de ser dado em menos tempo.

O programa de Português no 12º ano também é um tanto ou quanto denso – eu adorei esta cadeira, e era muito bom aluno a Português, mas penso: para que o "Memorial do Convento" de José Saramago seja dado como deve ser, é necessário mais tempo. Enquanto mero leitor, adoro esta obra (já a li três vezes), mas para a estudar detestei. Porquê? Porque era extremamente complicado analisar-se morfológica, gramatical e sintacticamente a obra. Devo dizer que dou graças ao facto de que o exame nacional que realizei no 12º ano (no ano lectivo 2007/2008) não tinha nada sobre esta obra, mas sim sobre a "Mensagem" de Fernando Pessoa e "Os Lusíadas" de Camões – matérias em que, modéstia à parte, era muito bom aluno – pois considero o "Memorial do Convento" de difícil análise (posso estar enganado). No entanto, ainda no Português, desperdiça-se um ano inteiro (o 10º ano) para ensinar a pontuação, coisa que achei ridícula. Que proponho? Bom, além de que a pontuação deve ser dada todos os anos sem excepção, o programa do 12º ano deve ser melhor dividido – o "Memorial do Convento" necessita de tempo para ser dado, não basta um mês ou dois.

Os programas de Ciências Naturais, Geografia e Ciências Físico-Químicas do 7º ano também se encontram ridículos – em todas estas cadeiras, a dada altura do ano lectivo, dá-se exactamente o mesmo programa: o Universo. Para quê? Concordo que no ponto de vista das Ciências Naturais dá-se maior ênfase a uma parte, a Geografia dá-se maior ênfase a outra parte, e a Ciências Físico-Químicas a uma terceira parte, mas a maioria do tempo é ocupada, nas três cadeiras, com exactamente o mesmo latim. Pergunto-me porque não dar-se o comum das três cadeiras numa só cadeira, e depois com a devida remissão dava-se em cada cadeira o específico dela – poupava-se mais tempo lectivo.

Fora outros programas... mas isso tomaria muito tempo, neste momento, para analisar. Talvez noutro contributo venha a partilhar mais análises que realizei ao longo do meu percurso académico com os caros leitores.

Posso estar enganado, mas repito: é uma análise, e cada análise já é um contributo para se chegar o mais próximo possível da perfeição, já que o alcance da perfeição é impossível.

Um aparte: a carga horária. Todos nos queixamos, e com razão, de que os estudantes passam demasiadas horas nas escolas – eu próprio defendi isso enquanto estudante do liceu. Mesmo assim, pergunto: porque é que em cadeiras com programa mais complexo e extenso só há um X número de horas insuficiente, enquanto para outras há esse mesmo X número de horas que é excessivo por o programa dessas cadeiras ser menor e mais fácil? Quando fui estudante do liceu, só tinha cerca de seis horas semanais de Português e cerca de seis horas semanais de Matemática, porque é que não eram mais? Mas não de seguida, pois o cérebro humano só consegue estar concentrado durante cerca de 30 a 45 minutos de cada vez – foi um estudo realizado recentemente e já se encontra mais que provado.

A questão do estudo acompanhado: defendo-o, mas não da maneira como foi proposto recentemente. Cada professor possui o seu método de ensino e as suas regras sobre como fazer um determinado exercício, bem como um determinado ritmo de ensino – há uns que ensinam uma matéria durante três aulas, há outros que a ensinam durante quatro aulas, e esta discrepância é suficiente para arruinar tudo. Mais: o estudo acompanhado deve ser individual – ou quanto muito em grupos de dois. Cada aluno tem as suas dúvidas e o seu ritmo e facilidade/dificuldade de aprendizagem, e está mais que provado que turmas com mais de 10 alunos dá mau resultado – houve um ano em que me encontrei inserido numa turma que perfazia trinta alunos, para a qual o ensino foi horrível... o barulho que cada um fazia (mesmo que a "segredar") era tal que impossibilitava o desenrolar eficaz da aula, e prejudicava a aprendizagem. Por isso, e não só, também me oponho ao encerramento de escolas: é muito mais eficaz haver turmas de poucos alunos do que turmas de muitos alunos. E isso é a todos os níveis, inclusive a nível universitário.

Quanto aos chumbos: eu sou do tempo em que se chumbava, bem como (em princípio) todos os leitores deste sincero contributo. Eu nunca fiquei traumatizado por isso. E penso que não erro se afirmar que os caros leitores não ficaram traumatizados com isso. E pergunto-me se, a nível psicológico ou sociológico, o facto de pôr fim aos chumbos não penalizará a forma como os jovens vêm o mundo – neste sentido: no mundo dos adultos, há despedimentos, há castigos, etc. Se os jovens recebem uma educação (mesmo dentro de casa) sem castigos por fazerem algo de mal (mas devo sublinhar: castigar não é sinónimo de dar palmadas ou de bater!!!), ou sem os chumbos nas escolas, poderão formular uma ideia errónea daquilo que é a sociedade, e com isso sim ficarem traumatizados. Para mais: o fim dos chumbos só vem apoiar o facilitismo e a transformação do país numa fábrica de doutores – todos somos doutores, mas só alguns têm a cabeça de tal, os restantes só possuem o título. E esse facto vem descredibilizar os que são doutores de título e de cabeça – basta ver-se, a nível do ensino superior, que uma licenciatura hoje não é mais que aquilo a que antigamente se chamava de bacharelato. E os que são licenciados pelo regime antigo (portanto, anterior à reforma de Bolonha), são menosprezados por só se ter em conta o título e não o "por detrás do título".

É urgente alterar-se a forma como a (des)educação se encontra em Portugal, mas não basta uma análise generalizada e superficial, meramente com base em números: é preciso conhecer bem o campo em que se está a trabalhar, é preciso analisar-se cada caso em concreto. Portugal pode melhorar, mas é através do voto em quem proponha medidas com coerência e concretas e não com utopias que irão prejudicar gravemente o país. Ou seja: o voto não pode continuar a pertencer aos populistas, mas sim aos que propõem as medidas concretas e (talvez) eficazes. O voto tem que ser dado aos verdadeiramente Socialistas e não aos populistas neo-liberais e capitalistas. Há que lutar contra a ignorância e à falta de cultura com eficácia, e a limpeza tem que começar em casa: mude-se o sentido de voto em Portugal!

Fernando Barbosa Ribeiro

Nota: este texto foi originalmente escrito a 14 de Agosto de 2010.

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