"O QUE FAZEMOS POR NÓS PRÓPRIOS MORRE CONNOSCO, MAS O QUE FAZEMOS PELOS OUTROS E PELO MUNDO PERMANECE. E É IMORTAL." (ALBERT PINE)

Museu José Manuel Soares (Casa da Cultura - Pinhel, Guarda)

Museu José Manuel Soares (Casa da Cultura - Pinhel, Guarda)
A equipa de "ABYSSUS LUSITANIS - O Abismo de Portugal" apoia e procura auxiliar a divulgação e convidar os nossos leitores a visitar o Museu José Manuel Soares (Casa da Cultura), em Pinhel (Guarda).

sábado, 24 de outubro de 2015

ELEIÇÕES LEGISLATIVAS – UMA NOTA PEDAGÓGICA


Caro leitor, não venho defender nenhum partido neste contributo sincero. Outrossim, venho tentar explicar – a “pedido” de muitos amigos com quem falo pessoalmente e/ou através de e-mails e redes sociais (as aspas devem-se a ninguém me ter pedido nada; eu é que peço não ser obrigado a repetir-me tantas vezes quantas pessoas com quem falo diariamente) – no que consiste realmente uma eleição legislativa (em I). Só no final (em II) aplicarei a teoria à prática, seguindo os factos resultantes das eleições legislativas portuguesas de 04 de Outubro de 2015. Por último (em III), darei o meu parecer – repito, sem querer defender o partido A ou B por ser o A ou o B! – de acordo com o exposto nos outros pontos; e uma lista de livros e links cuja leitura recomendo e na qual me baseio (em IV) para sustentar aquilo que deixo aqui escrito.

Cumprindo o meu dever enquanto jurista, imparcialmente, informo!

I
Um mito urbano: ninguém elege Governos! As eleições legislativas destinam-se a eleger deputados para assentarem na Assembleia da República. Fique, desde já, registado algo que vou repetir muito no presente contributo.
Os partidos podem concorrer à Assembleia da República (e nunca ao Governo!) coligados ou não. Apresentando-se coligados, elaboram as suas listas proponentes aos assentos na Assembleia da República com base no acordo que os partidos envolvidos celebrarem entre si; no caso de não haver coligação, os partidos elaboram as suas listas conforme lhes aprouver.
O que é certo, desmentindo outro mito urbano, é que as coligações terminam/deixam de existir na hora, no minuto e no segundo em que as urnas são fechadas para contagem dos votos. O que prevalece intemporalmente nessas coligações é as listas de candidatos elaboradas em cada círculo eleitoral!
Esclarecendo: por regra, um círculo eleitoral corresponde, aproximadamente, a um distrito. Portanto, a única sobrevivente de uma coligação-candidata é a lista de candidatos que a mesma elaborou nos diversos círculos eleitorais existentes!
Assim sendo:
Todos votam para atribuir assentos (na qualidade de deputados) da Assembleia da República às listas de candidatos dos partidos proponentes a tal.
A confirmar que se trata de mito urbano: alguma vez foi visto, seja em que país for, deputados de uma coligação? Eu só conheço deputados do partido A, do partido B… e nunca da coligação A ou da coligação B!!!

Contados os votos e atribuídos os assentos, é hora de ver quem é o mais votado. Só aqui é possível parecer (mas que não é real!) que as coligações continuam a existir… esclareço: se são candidatos como coligação, seria impossível determinar quem é que, votando na coligação, queria votar no partido A ou B da coligação X!!! Logo, aí, como se os votos de mais que um partido fossem somados, pode dizer-se que X ou Y (candidato como coligação) tem mais ou menos votos que o partido A ou B ou a coligação W ou Z. Mas, reitero, a coligação já foi – o termo correcto é este! – dissolvida com o encerramento das urnas.

Outro mito urbano: ninguém trai ninguém realizando acordos pós-eleitorais de “coligação” (porque NÃO É uma coligação se não se candidatou como tal: é um acordo pós-eleitoral… na prática, outrossim, funciona como se fosse uma coligação) entre partidos. É uma possibilidade que a Lei confere! Para formar Governos não é comum ver-se (pelo menos na Europa), mas é o dia-a-dia por excelência de muitas autarquias locais portuguesas! E, neste ponto em particular, a lei é igual: é possível, e não significa enganar/trair ninguém.

Continuando o percurso: os deputados são nomeados conforme os votos e as listas. Uma vez feito, o partido, coligação ou acordo interpartidário propõe-se ao Presidente da República para formar Governo. Sim, disse bem: pode ser uma coligação (que o foi como candidato, e os seus votos foram contados como tal), um partido isolado, ou o resultado de um acordo pós-eleitoral entre vários partidos (daí eu ter utilizado o termo “acordo interpartidário”). O Presidente da República deve convidar e nomear aquele – seja ele qual for! – que mais assentos na Assembleia da República (e, portanto, mais votos) tiver, para formar Governo. [Por lei, ninguém se candidata a, nem se apresenta para, formar Governo: a Constituição da República Portuguesa diz muito claramente que o Presidente da República é que convida o(s) partido(s), e não que o(s) partido(s) se popõe(m)!!!]

Aqui, o Primeiro-Ministro por regra (mas não obrigatoriamente!!!) é o principal candidato do partido/coligação/acordo, e cabe a este nomear o seu Governo (sendo que, aqui, as regras não são muito rígidas quanto a vincular as listas de candidatos).
Assim, temos um Governo nomeado.

II
A 04 de Outubro de 2015, em Portugal, houve eleições legislativas. Esquecendo os números por agora, os partidos foram eleitos pela seguinte ordem de lugares: PÀF (Coligação PSD-CDS), PS, BE, CDU (Coligação PCP-PEV), PAN. Posto isto, e só olhando para este mapa, a PÀF saiu a vencedora das eleições… dependendo, agora sim, do resultado eleitoral (dos números) e de possíveis acordos pós-eleitorais que sejam realizados.
Nota: o BE é a única coligação que é excepção à regra... se calhar por ser "bloco"!...
A PÀF venceu sem maioria absoluta (aliás, encontra-se bem distante de tal), o que significa que encontra-se extremamente dependente dos eventuais acordos pós-eleitorais que se realizem entretanto (e daí o prazo para o Presidente da República indigitar um Governo!).
Eis a tabela dos resultados eleitorais (na qual só constam os partidos supra referidos) – fonte: http://www.legislativas2015.mai.gov.pt/


  
Uma explicação à tabela: encontramos “repetições” do PSD e do CDS noutras situações, uma vez que nos arquipélagos da Madeira e dos Açores não existiu, nem existe, PÀF. Temos a Aliança Açores (Coligação CDS-PPM), o PSD-Açores, o PSD-Madeira e o CDS-Madeira.
Veja-se agora, e em concreto, o número de deputados com assento na Assembleia da República de cada partido. Reitero, e note-se bem: não existem quaisquer coligações! Fonte: http://www.parlamento.pt/DeputadoGP/Paginas/GruposParlamentaresI.aspx


Uma conclusão óbvia que se pode tirar realizando simples contas de somar: a Direita (isto é, o PÀF; ou a soma PSD com CDS) possui 107 deputados, a Esquerda (isto é, a soma PS com BE, PCP e PEV) possui 122 deputados, e (de posição ainda publicamente incerta, apesar de o seu assento, neste momento, na Assembleia da República, ser à esquerda…) 1 deputado do PAN.
Posto isto, caro leitor, parece óbvio quem tem “a faca e o queijo na mão”… SE houver acordo pós-eleitoral (que, segundo a comunicação social, há e é da forma como fizemos as somas supra).

III
Subscrevendo muitos (e de todos os partidos!) comentadores políticos e “tudólogos” da nossa comunicação social: o Presidente da República teve o desplante de desrespeitar a verdadeira vontade dos portugueses. Aliás, teve o desplante de, indirectamente, propor/sugerir a ilegalização do PCP… e não só, mas também do PS e do BE – ou seja, a ilegalização de toda a Esquerda nacional!!! O que, pelo Código Penal, constitui crime – instigar publicamente à discriminação em razão da opção/ideologia política (pode-se dizer: no mínimo, à sua perseguição; rebuscando, a homicídio, a ofensas à integridade física, a coacção, entre outros tantos crimes). Problema: foi tudo dito por meias palavras, e pode existir quem não saiba Língua Portuguesa…
Por conhecimento de facto, os acordos pós-eleitorais são o dia-a-dia das autarquias locais (como já afirmei): verifica-se muito os acordos PSD-CDU e PS-CDU, por exemplo.
O Governo agora deposto de Passos Coelho, note-se bem!, foi resultado de um acordo pós-eleitoral!!! Efectivamente, o partido mais votado fora o PSD, o qual, para tornar a sua maioria numa absoluta, fez acordo com o CDS.
Ou seja: um acordo entre um partido vencedor e outro está correcto; mas um acordo entre partidos não-vencedores já não está bem! Discriminação, é dizer pouco!!!
Tenho dito.

IV
Links (dois deles já referidos, mas reitero-os):
- Composição da Assembleia da República (por partido): http://www.parlamento.pt/DeputadoGP/Paginas/GruposParlamentaresI.aspx
- Outras informações sobre como é constituída a Assembleia da República: https://www.parlamento.pt/DeputadoGP/Paginas/default2.aspx
- Informações sobre como é constituído o Governo: http://www.portugal.gov.pt/pt/a-democracia-portuguesa/o-governo/o-governo.aspx
- Lei Eleitoral da Assembleia da República: http://www.cne.pt/sites/default/files/dl/legis_lear_2015.pdf
- Lei Eleitoral da Assembleia da República (versão comentada/anotada): http://www.cne.pt/sites/default/files/dl/learanotada2015-cne-web.pdf

Livros (maioritariamente jurídicos – indico os links de cada um por uma questão de logística de texto):
- Constituição da República Portuguesa (anotada/comentada) de Gomes Canotilho e Vital Moreira: http://www.almedina.net/catalog/product_info.php?products_id=978 e, a completar, http://www.almedina.net/catalog/product_info.php?products_id=11975
- Manual de Ciência Política e Direito Constitucional (Marcello Caetano): http://www.almedina.net/catalog/product_info.php?cPath=2_42&products_id=844 (apesar do nome, é o único existente)
- Direito Constitucional e Teoria da Constituição (Gomes Canotilho): http://www.almedina.net/catalog/product_info.php?cPath=2_42&products_id=852
- Manual de Ciência Política e Direito Constitucional (Zeferino Capoco): http://www.almedina.net/catalog/product_info.php?cPath=2_42&products_id=27813
- Manual de Ciência Política e Sistemas Políticos e Constitucionais (Manuel Proença de Carvalho): https://www.quidjuris.pt/Default.aspx?Tag=BOOK&Id=741
- (Numa perspectiva expositiva/explicativa e crítica) Lei Eleitoral para a Assembleia da República - Proposta de Configuração de Círculos Uninominais (Rui Oliveira Costa): http://www.almedina.net/catalog/product_info.php?products_id=8774

Entre tantos outros – os supra referidos são apenas sugestões. Observação: não ganho nada em sugerir ou deixar de sugerir estas, e outras, obras. Tratam-se, outrossim, de algumas das que li e/ou que sempre consultei e consulto.






Fernando Barbosa Ribeiro

(rectificado a 27/10/2015 - FBR)